Como agro brasileiro se tornou referência mundial em reciclagem de embalagens de defensivos

  • 26/10/2025
(Foto: Reprodução)
Conheça o sistema de logística reversa que evita o descarte de embalagens de defensivos Produtor de amendoim e soja há 45 anos em Guaíra (SP), Luiz Brito não descarta a embalagem nem dá a ela qualquer finalidade depois de utilizar um defensivo na lavoura: primeiro, ele lava três vezes e armazena em um local apropriado até levar a um centro de coleta, de onde o material será retirado para indústrias capazes de reaproveitar toda a matéria-prima em novas embalagens para, mais uma vez, armazenarem insumos. "Na cultura do amendoim e da soja, as devoluções de embalagem se concentram entre os meses de novembro e março. No meu caso, umas 400 por mês", diz. O agricultor está na ponta de uma cadeia produtiva que, graças ao alinhamento entre tecnologia, organização da iniciativa privada, legislação e fiscalização, torna o Brasil um exemplo mundial em logística reversa de embalagens plásticas de defensivos agrícolas. Siga o canal do g1 Ribeirão e Franca no WhatsApp Em 24 anos, o volume de embalagens vazias processadas cresceu 20 vezes desde o início das operações do "Sistema Campo Limpo", nome dado à política nacional de logística reversa desse tipo de material financiada pelas próprias indústrias do setor. Começou com 3,8 mil toneladas, atingiu mais de 68 mil em 2024 e deve estar próximo de 75 mil toneladas em 2025, segundo Marcelo Okamura, diretor-presidente do Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpEV). Desde 2002, foram mais de 800 mil toneladas recicladas que evitaram a emissão de mais de 1 milhão de toneladas de carbono equivalente (Co2e), o mesmo trabalho de 7,5 milhões de árvores. "É importante, primeiro, para você tirar esse material para não contaminar o ambiente e gerar novas matérias-primas a outras cadeias de valor. O lixo que era jogado no campo, com papelão e metais, volta para a cadeia de reciclagem e gera materiais de maior valor agregado", afirma. Cadeia produtiva de defensivos agrícolas conta com logística reversa de embalagens plásticas regulamentada por lei Divulgação/Sistema Campo Limpo O g1 conversou com integrantes do inpEV e conheceu uma das linhas de produção em Ribeirão Preto (SP), de uma das maiores indústrias de reciclagem plástica do país. A seguir, entenda como funciona o sistema. O agro e a produção de plásticos Das primeiras legislações à organização do setor Logística reversa: recibo de compra, tríplice lavagem e devolução Da compactação à resina pós-consumo Embalagens de defensivos: tecnologia e rastreamento O agro e a produção de plásticos Historicamente um aliado nos avanços da humanidade, da indústria à medicina, o plástico se tornou um dos vilões das questões climáticas devido ao descarte indiscriminado e fortemente associado à poluição de oceanos. Estima-se que, em todo o mundo, foram produzidas 500 milhões de toneladas do material em 2024, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), das quais quase 400 milhões se tornaram resíduos. De acordo com dados do pesquisador Silvio Vaz Júnior, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), apenas 16% é destinado para a reciclagem. Na agricultura, o plástico não é menos importante. Estufas para controle de ambiente e cultivo de hortaliças, sistemas de irrigação e proteção do solo são algumas das aplicações em suas variadas formas, inclusive para fazer frente às mudanças climáticas. Parte importante dessa cadeia, o transporte e a armazenagem de defensivos também encontrou no material uma solução confiável para um dos países que mais utilizam agrotóxicos no mundo: é resistente tanto para suportar adversidades do transporte quanto para se manter inerte à ação do produto, garantindo que ele chegue ao destino sem vazamentos. "O plástico é um material barato, moldável, (...) leve em termos de transporte. É muito mais vantajoso do que os metais, que o vidro. (...) O culpado são as pessoas que não têm essa capacidade, essa educação de fazer essa logística reversa de plástico, ou o culpado é o próprio plástico? Quem tem culpa são as pessoas que fazem do plástico um lixo", afirma o representante do inpEV. Das primeiras legislações à organização do setor A criação de um sistema de logística reversa de embalagens de defensivos, sem paralelo em outros segmentos da economia, é consequência de uma sequência de marcos regulatórios que se iniciou nos anos 1970, com as primeiras legislações sobre o assunto. Segundo Okamura, é dessa época uma importante pesquisa de fabricantes de agrotóxicos que constatou a dificuldade dos agricultores em destinar as embalagens. Estes que enterravam ou queimavam os recipientes, quando não reaproveitavam desavisadamente para outros fins. "Era uma destinação que tinha o risco de um reciclador pegar o material, produzir resinas sabe-se lá com que nível de contaminação e produzir qualquer artefato. (...) O agricultor não tinha muita opção. Na verdade, as opções eram muito desfavoráveis." Sistema de logística reversa de embalagens de defensivos agrícolas entrou em atividade em 2002 no Brasil. Divulgação/ Sistema Campo Limpo/inPEV Essa preocupação levou à promulgação da Lei Federal 7.802, a Lei dos Agrotóxicos, de 1989, mais tarde atualizada por textos como a Lei Federal nº 9.974, regulamentada em 2002, que disciplinou a logística reversa de embalagens de defensivos agrícolas no país e inclusive estabeleceu parâmetros para fiscalização e aplicação de sanções, quando as normas não são seguidas. Em 2001, uma entidade foi criada para cuidar desse assunto, o Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpEV). Formado por mais de 200 indústrias e entidades como a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o instituto é o idealizador do Sistema Campo Limpo, nome dado à política brasileira de logística reversa das embalagens de defensivos agrícolas. Hoje, o sistema integra agricultores, postos de coleta credenciados, centros de distribuição, além de indústrias recicladoras e revendas, e é regulamentado pela Lei Federal 14.85, de 2023, e pelo decreto federal 4.074, de 2022. "Para ser eficiente, o agricultor tem que fazer a parte dele, o distribuidor tem que fazer a parte dele, a indústria tem que fazer parte dela, mas os órgãos públicos têm que fazer a parte deles também, porque, se não tiver fiscalização, como vamos controlar o sistema?", afirma Okamura. Sistema de logística reversa conta com lavagem e separação de embalagens de defensivos Divulgação/Sistema Campo Limpo Logística reversa: recibo de compra, tríplice lavagem e devolução Pelo menos dois princípios norteiam esse sistema para que ele faça sentido, segundo Okamura. Um deles é a reciclabilidade, ou seja, a garantia de que aquele material pode ser reaproveitado. Porém, mais do que evitar o descarte, o sistema tem o objetivo de garantir que o mesmo plástico nunca mais volte à natureza. É o que o diretor do inpEV chama de circularidade. "Eu produzi essa embalagem e essa embalagem foi reciclada, mas não vai parar aqui, vai reciclar de novo e vai reciclar de novo." Com essas bases, esse sistema conta com os seguintes integrantes: agricultores: responsáveis por levar aos pontos de coleta as embalagens para serem recicladas; pontos de coleta e canais de distribuição: mais de 400 unidades de recebimento fixas e móveis aptas a receber embalagens usadas; parte delas também prepara os "packs" que serão levados às indústrias; indústrias: capazes de receber as embalagens, retrabalhar a matéria-prima, chamada de resina pós-consumo (RPC), e fabricar novas embalagens; poder público: os estados são responsáveis por fiscalizar os entes envolvidos e aplicar sanções, se necessário. Tudo começa com o agricultor. Assim que compra um defensivo, fica com um recibo que descreve o local para onde aquela embalagem deve ser levada no prazo máximo de um ano. "Quando ele chega a uma unidade de recebimento, nós temos um sistema que fala assim: você está retornando 200 bombonas de 20 litros, 100 bombonas de 10 litros (...) e ele tem um recibo que tem que guardar por um ano. Dentro desse ano, qualquer fiscalização na propriedade, se ele não tiver esse recibo, ele é multado. E o agricultor que não entregar as embalagens a legislação diz que ele pode ser penalizado até com detenção", explica Okamura. Ao terminar de utilizar os defensivos, o agricultor fica então responsável por realizar a tríplice lavagem na embalagem e armazená-la em um local seguro até que leve a um ponto de coleta credenciado. Isso se forem as embalagens destinadas a soluções líquidas, que geralmente são rígidas, de polietileno de alta densidade, e consideradas laváveis. "No momento da aplicação, após estar vazia, já é feita a tríplice lavagem no campo. Retira as tampas, de preferência se faz um furo nas embalagens e vai armazenando dentro de bag. Quando acumula uns quatro bags, eu levo para a base de recolhimento. Costumo falar que graças a Deus tem hoje esses centros de recebimento de embalagens, pois ficaria muito difícil direcionar essas embalagens", afirma Luiz Brito, de Guaíra (SP). 🔎A tríplice lavagem é um método bastante simples, mas eficaz, que consiste em lavar a embalagem três vezes com água limpa e que é inclusive regulamentada por uma norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a NBR 13968. Esse método pode ser substituído pela lavagem sob pressão, feita com o auxílio do próprio pulverizador. "Ele faz um enxágue dessas embalagens por três vezes. Coloca um pouco d'água, chacoalha e coloca essa água no tanque de pulverização para não jogar no solo, em lugar nenhum. Ele faz esse processo por três vezes para tirar todo o resíduo que fica dentro dessa embalagem. Fazendo esse processo, tem estudos que comprovam que retira mais de 99% do produto que estava dentro, deixando menos de 100 partes por milhão de resíduos dentro dessa embalagem", afirma Okamura. 🚩Para outros casos, como de embalagens não laváveis ou flexíveis e contaminadas, a lavagem não é válida. A orientação é o armazenamento em local seguro, sem vazamentos e sem contato externo, até a destinação aos pontos de coleta. Na sequência, a devolução dessas embalagens ocorre por meio de um agendamento eletrônico disponível no site do inpEV em que ele determina a data e o local. No estado de São Paulo, são pelo menos 9 cidades com estrutura para receber esses materiais. Essas centrais possuem certificação ISO 9001. "Durante esse período, ele não pode deixar essa embalagem no tempo, tem que ter um lugar apropriado para guardar até a devolução." Agricultor há 15 anos em Araraquara (SP), José Mário de Castro Marcato chega a utilizar dez embalagens de 20 litros cada em época de plantio. "Após o uso das embalagens, elas são lavadas na roça e, antes de armazená-las para a coleta, verificamos e fazemos uma nova lavagem e fazemos o corte. A destinação correta é importante para não haver contaminação indevida. Se forem para um centro de reciclagem comum, poderá afetar o produto final que será reutilizado, na natureza é um lixo persistente de longas décadas", diz. Plástico de defensivos agrícolas é processado até se tornar resina pós-consumo para produção de novas embalagens. Divulgação/Sistema Campo Limpo Da compactação à resina pós-consumo Levadas aos postos de coleta, as embalagens são transportadas pelas próprias indústrias para centrais de recebimento, onde é feita a compactação das embalagens, antes de serem levadas para a reciclagem industrial. Tanto os postos quanto as centrais precisam atender a uma série de requisitos estabelecidos pela Resolução 465 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para que a destinação seja considerada segura. "O chão tem que ser concretado, tem que ter um pé direito de tal tamanho, tem que ter uma certa estrutura que tem que ser coberta, não pode deixar essas embalagens ao vento, não pode tomar chuva. Então tem uma série de condicionantes para que se tenha essa licença." Pelo Sistema Campo Limpo, esses grandes pacotes de plástico têm como destino dez indústrias recicladoras espalhadas pelo país que têm a capacidade de processar o plástico até o transformar na resina pós-consumo (RPC), a matéria-prima para a produção de novos itens de plástico. A partir dela, as unidades parceiras produzem cerca de 40 produtos diferentes, de conduítes de energia elétrica e tubulações de esgoto, além de novas versões das mesmas embalagens rígidas de agrotóxicos, produzidas especificamente por apenas uma indústria no interior de São Paulo. Segundo o inpEV, 100% de todas as embalagens rígidas e de suas tampas que entram no sistema são recicladas. A exceção fica com itens como equipamentos de proteção individual (EPIs) contaminados e plásticos flexíveis que ainda precisam ser destinados para incineração. "Toda logística reversa é paga pela indústria. Toda mão-de-obra é paga pelo sistema. Toda incineração daquilo que não presta para reciclar, nós pagamos, gastamos quase R$ 10 milhões todos os anos para queimar materiais que não estão em condição de ser reciclados." Essa realidade, de acordo com Okamura, deve mudar nos próximos três anos, com a abertura de uma nova indústria especializada em reciclagem de embalagens flexíveis no interior de São Paulo. "Quando nós atingirmos isso em 2028, nós vamos estar incinerando aí 2 a 3% do material que é lixo que nós não temos como reciclar." Embalagens produzidas a partir de resina pós-consumo passam por testes de qualidade e resistência antes de voltarem ao mercado. Divulgação/Sistema Campo Limpo Embalagens de defensivos: tecnologia e rastreamento A única indústria hoje direcionada para embalagens de polietileno de alta densidade para agrotóxicos a partir da resina pós-consumo produz, por ano, mais de 15 milhões de unidades em suas plantas localizadas em Taubaté (SP) e Ribeirão Preto. Com o aumento da demanda pelo produto, que não perde em qualidade para os recipientes feitos a partir de matéria-prima virgem, o grupo Campo Limpo - que tem o mesmo nome do sistema de logística reversa de que faz parte - investiu nos últimos anos mais de R$ 20 milhões para aprimorar e expandir suas atividades. "Nós estamos falando de algo em torno de 14 mil toneladas de plástico reciclado que a gente transforma todos os anos", afirma Rogério Fernandes, diretor de operações da Campo Limpo. No chão de fábrica, equipamentos de última geração, chamados de extrusores, derretem os grãos de RPC para que se tornem maleáveis. O plástico então é expelido por sopradores, em um aspecto que lembra grandes bexigas, a altas temperaturas, para então ser moldado. Assim que o molde toca esse material, a embalagem, cujo desenho e especificações foram previamente programadas, ganha não só a forma final como também uma série de indicações e especificações impressas, entre elas um código que indica a origem e dá rastreabilidade ao produto. Ou seja, quem compra aquele produto saberá que ele foi feito a partir de um processo sustentável. "Essa matéria-prima, a origem dela são embalagens pós-consumo, evidentemente, que passaram pelo processo de reciclagem. Primeiramente elas foram moídas e lavadas para esse material ter condições de ser extrusado novamente e obter a matéria-prima. Uma vez isso feito, essa matéria-prima entra no nosso sistema de alimentação das nossas sopradoras. Todas as nossas sopradoras têm um conjunto de extrusoras que vão processar este plástico e evidentemente soprá-lo novamente fazendo uma nova embalagem." Ao final do processo, essas embalagens, compostas por três camadas diferentes, passam por verificações no chão de fábrica, inclusive com uso de inteligência artificial, para garantir que elas estejam dentro das especificações, além de testes de qualidade e resistência por amostragem em um laboratório que funciona 24 horas por dia. "Uma vez essa embalagem soprada, ela vai passar por processos fora da sopradora para verificação de diversos pontos, toda parte de controle de qualidade até a gente embalar diretamente para o nosso cliente." Segundo Fernandes, cada embalagem de 20 litros feita a partir de material reciclado representa 1,49 kg de dióxido de carbono equivalente (Co2e) que deixou de ser emitido. "Uma árvore no seu ciclo de vida de 20 anos consegue sequestrar 140 kg de CO₂ equivalentes, ou seja, 100 embalagens desta daqui, feita com matéria-prima reciclada, equivalem a uma árvore em um ciclo de vida de 20 anos", diz. Veja mais notícias da região no g1 Ribeirão Preto e Franca VÍDEOS: Tudo sobre Ribeirão Preto, Franca e região

FONTE: https://g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/estacao-agro/noticia/2025/10/26/como-agro-brasileiro-se-tornou-referencia-mundial-em-reciclagem-de-embalagens-de-defensivos.ghtml


#Compartilhe

Aplicativos


Locutor no Ar

Peça Sua Música

Top 5

top1
1. Desejo Imortal

Gusttavo Lima

top2
2. Oi Balde

Zé Neto e Cristiano

top3
3. Nosso Quadro

Ana Castela

top4
4. Anti-Hero

Taylor Swift

top5
5. Hold Me Closer

Elton John feat. Britney Spears

Anunciantes